sábado, 16 de novembro de 2013

Raios-X

Isso que você diz que vê, não passa da ponta do iceberg que me tornei. Não me defina pelo que lhe mostro, há um pedaço muito maior de mim a se descobrir para dizer o que eu sou. Pedaço que eu escondo, muitas vezes, deliberadamente, a fim de manter essa casca intacta e agradável aos olhos que veem.
Sou mais quando se olha ao fundo, só que não tão frio assim. Tenho outras temperaturas também, apesar de, nem sempre aprazíveis...
Essa risada que me escapa enquanto os olhos se apertam, é desse pedaço de mim que aprendeu que está vivo é viver! Mas precisei morrer várias vezes e, algumas vezes, até me matar, a fim de dar conta da nova pessoa que se formara em mim, que eu precisava ser.
Todas as dores que atravessaram esse corpo que ri, deixaram marcas profundas que não se apagam com outras risadas e batons. Compõem a pessoa que me tornei, mas ao custo de carregar feiuras que emergem mesmo em dias ensolarados e noites frescas.
Essa pele sensível que capta pequenas partículas de emoção e delicadeza reveste, na verdade, outra camada marcada de cicatrizes que lhe conferem uma característica mais rígida, ríspida e pouco bela. É dela que escapam os raciocínios rápidos, grosseiros, impregnados de malícia e veneno.
Acredite, sou capaz de ofender com um olhar... 
Com esses mesmos olhos que choram e se enternecem com música e fotografias, com uma linda manhã, com abraços carinhosos e com a dor do outro. Eu também firo, julgo, condeno e mato. E me envergonho... Sofro com essa dureza que não sai de mim e com as ações e reações que provocam.
Esse colorido que se mostra é meu desejo de ser beleza aos que me cercam, de completar o que lhes falta, de ser socorro, lugar afável e luzente, de ser a mão que ergue com a mesma bondade das que me sustentaram. Porque, em raios-X, sou preto e branco e muito contraste.


Vazinhos dos sonhos

Não sorriu, não floriu o rosto daquela menina que plantou sonhos na janela.
Mas, também, pudera!
Tantos vazinhos, de uma só vez, naquele lugar...
Como faria para, todos os dias, a cada um regar?
Assim, resolveu por todos à vista para provocar encanto,
E logo, foi fácil aparecer alguém para ir colaborando.
Apesar do desejo de ver todos os vazinhos brotando, florindo.
Cuidadosa que sempre fora, não aceitou, assim, à toa
Qualquer mão que tivesse surgido.
Sabia que aqueles seus vazinhos, tão lindos
Precisavam de mais que mãos, água e iluminação.
Mas de nada adiantou seu proceder,
Cada um que passou deixou um lindo vazinho se desfazer.
Pobre menina, sempre a juntar
Todos os pedaços que derrubavam de lá.
Se não despencava, quebrava, murchava, amassava.
Oh, quanta gente sem trato, sem jeito
Com seus lindos vazinhos queridos, do peito...
Pobres vazinhos, pobre menina!
Pobres sonhos cuidados sem nenhuma destreza.
Não sorriu a menina, nem floriram seus sonhos da janela.
E, cuidadosa que sempre fora,
Assustada que ficara,
Guardou todos os vazinhos, dessa janela perigosa.
Encontrou esta saída
E, assim, achou que ficaria protegida.
Contudo, se engana quem imagina 
que lamentou, a menina, todas as suas visitas!
Que de bom grado, foram todas recebidas.
É que aquela menina, cujos sonhos não floriram,
Soube guardar bem toda boa vontade que viu
Naqueles que passaram pela janela que não floriu.
Sabia que eles tentavam fazer o sonho germinar,
Só que, suas mãos não tinham o dom, nem medida certa de manejar
Aquelas plantinhas miúdas tão necessitadas de jeito,
Quase que de oração
Porque eram vazinhos dos sonhos
De dentro do seu coração.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Palavras em silêncio

Angustiada. Queria outra palavra que não esta porque, talvez, nela não contenha, exatamente, o que me abate. Porém, ultimamente, ando meio sem palavras, preciso recorrer às que me vêm...

Tenho dificuldade com o silêncio, assim, puro! É que, na minha formação, o silêncio não é uma resposta muito clara, quando não acompanhada de olhares e outras metalinguagens. Esse silêncio sem filtros, nem ruídos, nem sinais são, para mim, indecifráveis e inquietantes. E, como eu já me despi das partes mais rígidas de minha armadura, estou deambulando como criança em parque de diversão vazio e sem luz ou companhia.

Não sei se angústia ou ressaca! Então, deve ser isso... Ressaca. Bebi tudo que li e fiquei completamente embriagada. Mas, como não beber? Nunca tinham me oferecido sabores tão afáveis e intensos, descritos com vírgulas e reticências, sem pontos finais... Inerte, sem noção de tempo e espaço - já até descalçada - sentei à margem da rua e declamei medos e desejos. Que risco!

Vontade. Essa é uma palavra que me cabe. E quem não teria? Só uma alma que não dança, não canta, não chora e nem sussurra. Oras, coube no meu abraço e na minha canção... Obviamente, essa alma que padece por gentileza e sutileza, não teria outra saída se não o desejo de levar ao próprio coração.

Por fim, creio mesmo que agora é espera! Enquanto não findar esse gosto de beleza intrínseca que ficou na minha garganta, ainda não digerida, nem completamente degustada; enquanto não se encerra esse torpor, essa confusão emocional; enquanto não se dispersarem todas as notas que ainda ouço, a espera será minha companheira. E essas palavras em silêncio...

Contudo, vale ressaltar, minha resiliência. É dela que me valho! Essa capacidade incrível de suportar, de permanecer e de esperar todas as coisas encontrarem seu curso, seu lugar.

domingo, 10 de novembro de 2013

"Solidariano"

Debruço os meus ouvidos e os meus olhos, sobre aquele por quem meu coração se enternece de compaixão. Ao tocar-lhe com o olhar, faço uma prece interior a fim de que suas palavras me alcancem o coração e para que minha escuta não lhe cause angústia e dor. Dói-me que seus pensamentos, independentemente de sua natureza, lhes sejam tolhidos, sufocados ou fragmentados, involuntariamente. É um silêncio que se manifesta na palavra, na espontaneidade suprimida.
Ah, Senhor, não fosse a compostura necessária, me ajoelharia aos pés deste que vos falo e lhe imploraria a liberdade da sua vida! Posto que não funcionaria, recolho-me em busca da técnica adequada, mas me deparo sem o domínio do saber técnico, tampouco do saber do viver.
Ledo engano acreditar que lhe desejo todas as palavras sem mácula e adornadas de luzes angélicas, como que nascidas pela primeira vez e que apontam e descrevem o mundo sem o crivo dos juízes populares e acadêmicos. Não, não só...  Queria mais uma existência sem culpa – para si e para os seus – iluminada por olhos que sorriem tanto quanto os lábios. Queria-lhe mais o direito de ter vida própria, como astro luminoso, resplandecendo em si e de si.
Quem falou que a ignorância era uma dádiva, descreveu um confortável espaço mental, no qual são permitidos todos os delírios fantasmáticos do imaginário popular. Contudo, fui banida desse limbo... Sendo assim, se por um lado perseguem-me as frustrações, por outro, a resignação não é minha companheira. Eu a repudio, tanto quanto a água ao óleo, no mesmo instante em que a dor do outro me consome.