Definitivamente, o inusitado
está reservado para mim! Eu só preciso me acostumar com isso... Com o
imprevisto, com o não planejado, com o surpreendente. Com essas coisas que
devem acontecer todos os dias, mas que você só viu em cena de filme ou na
história que alguém contou. Não com você!
Um homem que
não deve ter casa, e que – com certeza! – viu a chuva cair muito mais vezes do que
eu, sorriu! Sorriu não, riu de mim! Um mendigo, que minutos antes levara
noventa centavos em moeda que eu carregava no bolso, gargalhou, pasmo, ao me
ver sentada no banco do parque. Ele achou graça porque eu aceitei a chuva como
companhia enquanto dividia um guarda-chuva de maneira meramente ilustrativa. Ele
riu porque, diferente dos normais que apenas estranhavam aquele comportamento, sabia
que naquele banco, apesar do guarda-chuva, ninguém estava se importando em se
proteger, em não se molhar, já estávamos molhados! O mendigo riu de mim porque
viu o que ninguém viu. E eu vou guardar essa cena pra sempre!
Assim como ninguém
viu os sofrimentos daquele menininho tão lindo e seus planos para se livrar do
padrasto. Eu vi e ele resolveu me contar... Pobre padrasto, nem sabe dos crimes
que cometeu. Talvez, por querer fazer a coisa certa e ser bom o bastante,
roubou os sonhos e comprometeu as grandes fantasias de seu enteado. Talvez mesmo,
eu nem precisasse saber de tanto, mas ele me contou... Contou seus medos, seus
planos e seus sonhos. Talvez não! Eu realmente não precisava saber, exceto para
começar a me perguntar: por que eu?
E como não se
perguntar? Oras, eu trabalho num lugar com mais dez pessoas capazes de exercer
a mesma atividade e qualquer outra dessas podia ter recebido aquela criança tão
linda e esperta, que nem pareceu precisar de mim. Só que eu recebi o filho, eu
escolhi receber a mãe e eu resolvi perguntar como ela estava, não apenas
perguntar, eu, realmente, quis saber. E para quê? Eu não precisava. Só que, ela
sim! E foi assustador... Era tanta dor que ela carregava que quase banhou o
lugar que estávamos. Foi tanta dor que saiu dela que até doeu em mim... Eu me
desfiz de um jeito que para me refazer de novo levou um tempo maior do que eu
imaginava.
Eu me refiz e
nesse novo formato, já mais disposta a captar esses sinais estranhos e ainda
pouco decifrados, meu novembro se completou com uma mocinha de seus 13 anos e
uma vida incrível. É óbvio que eu quis saber da vida dela! Afinal, não é todo
dia que alguém lhe convida para assistir a um casamento sem nem conhecer os
noivos! Tudo que ela queria era companhia para ver os vestidos e a maquiagem
que as convidadas usavam e, claro, a noiva. Tão intrigante quanto o episódio, a
jovem garota que pega quatro conduções para ir à escola, faz cursos à tarde,
usa roupa de bazar e que nunca foi ao shopping, me ensinou que a vida reserva
surpresas a cada momento.