quarta-feira, 23 de abril de 2014

Se quiser saber, olhe


Abro fendas profundas continuadamente e exibo as entranhas sem despir uma veste. E, por mais profundas que elas sejam, não dão conta de mostrar o que nelas há. Nem eu mesmo tenho certeza do que se pode encontrar, tanto que, às vezes, até me assusto: vez ou outra me dou uma novidade! Minha única certeza é minha infinitude, não que seja eterna, mais inacabada, quase poço sem fim.

Porém, se quiser saber, aproxime-se e veja. Não espere que eu desfie sobre mim, não me rendo tão facilmente. Para me ver, me saber, só mais de perto, quase rente a mim. Visto que, essas palavras que me saltam dos lábios são puro exercício de se fazer ver, de mostrar o que basta, estão prontas para me despistar. A quem quiser saber, olhe mais de perto e, sem perguntas, saiba. Minhas palavras não são resistentes quando olhadas por dentro, por essas janelas que apontam a alma, só por elas saem as verdades que me infortunam e contentam. Elas se rendem quando olhadas nos olhos...

Eu me perturbo, me provoco por horas a fio e me dou a impressão que vivo a me testar. Às escondidas, sangro o querer a fim de exercer o dever - ou suportar o devir? Por mim, me desfaço a fim de me mostrar inteira. Sou mesmo é um ensaio da loucura, revestido de equilíbrio e sensatez, que são superfície, parte de mim, não eu. Por baixo da pele, há um funcionamento que tem por ordem a intensidade e não a organização. 

E quem atestará se não me atravessam o olhar? Deram às palavras o poder de por ordem no mundo, mas elas não dão contam dos mundos particulares e suas sutilezas. Não de mim... De modo que, se não me têm os olhos, não me terá as palavras, nem fendas, nem verdades, nem mentiras. Há de se ter superfície: parte de mim, não eu.

Nenhum comentário:

Postar um comentário